terça-feira, 15 de março de 2011

While flying

Dormi contigo a noite inteira junto ao mar, na ilha.
Selvagem e doce eras entre o prazer e o sono, entre o fogo e a água. Talvez bem tarde, os nossos sonos se uniram na altura e no fundo, em cima como ramos que um mesmo vento move, em baixo como raízes vermelhas que se tocam. Talvez o teu sono se separou do meu e pelo mar escuro me procurava como antes, quando nem existias, quando sem te ver naveguei a teu lado e os teus olhos buscavam o que agora - pão, vinho, amor e cólera - te dou, cheias as mãos, porque tu és a taça que só esperava os dons da minha vida. Dormi junto contigo a noite inteira, enquanto a escura terra gira com vivos e com mortos, de repente desperto e no meio da sombra, o meu braço rodeava a tua cintura. Nem a noite nem o sonho puderam separar-nos. Dormi contigo, amor, despertei e a tua boca saída do teu sono deu-me o sabor da terra, da água-marinha, das algas, da tua íntima vida e recebi o teu beijo molhado pela aurora como se me chegasse do mar que nos rodeia.


Pablo Neruda

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